quarta-feira, 31 de março de 2010

O cão e o rei numa folha sem história























Era uma vez um cão que era rei e um rei que era cão.


Numa disputa de desejos, o cão venceu o rei e carregou na cabeça o que era símbolo de vitória. Um dia bem enterrado, cheio de vícios sujos e virtudes caxias. E, num súbito de tolices, uma face foi revelada: a de baixo.


O rei venceu o cão. Cavou até sair. Sem tumbas de ouro ou massagens esfoliantes reveladoras do carma monárquico, o homem partiu o coração do amigo. O cão latiu em voz alta.


O rei perdeu a fala...


"Faça-se a sua vontade!", e a folha falou em linhas.

01:04


Tic tic tic. Bate uma, bate. Batendo, bate... vai passando o tempo e meu contorno se deforma...

_o que o marcador de texto piscando quer dizer me aterroriza contra a parede. Vi muitos verdes que foram chamuscados de chuva e perderam a essência amarela. Minha vida inteira, hoje, foi paz junto da noite. Conheci um amontoado de acordes loucos tirados numa viola velha por um homem com vontade de fazer o diabo de mim. Tenho me agradado muito facilmente com o que vem dos outros.

Que a paz da madrugada esteja conosco!

E que os dias inteiros estejam presentes nas noites. O gato gaiato assobia lindamente uma canção para a lua  - uma das que ouço sempre numa espera sem desconfianças ou agonias. Essas noites estão tão boas com toda essa alegria contida! Fiu fiu, vem cá! O gato não quer saber de mim. Ele é do escuro, como seus pelos mostram. E ele também é da vida, que já nem lembra mais aquela candura do céu virgem pedinte. Foge! Some de mim!

O que nostradamus disse outrora morre ali, numa esquina de avenidas e pessoas, onde mora a morte que sempre faz visitas solidárias. Ele falava de uma felicidade partida e de um desespero consentido. Vem cá que hoje é dia de festa! Ali está! Uma tenda de papelão, suas palavras mendigas e nossas vidas em vão - uma paz foi aprendida. Não estrague esse momento! É instante de nem sei mais quê... Tudo que precede o pensamento, comprova ideia etérea. Acabou-se.

A noite é do gato. Deixe-o vazio.

terça-feira, 16 de março de 2010

Laranjas


O sol já se baixava no horizonte perdido. Com força alaranjada ele roubava a energia da donzela, e ela só fazia contemplar enquanto cosia na varanda de sua residência. Os pensamentos iam perdendo a cor aos poucos... a irmã de repente nem existia... a noiva era a irmã, que sumira no altar ao longe... os vitrais da igreja estavam partidos... os risos eram tristes... a mãe cantava a velhice nua e pálida... Do altar veio nada e, ao invés de fincar quietude, quis tudo que tinham para dar. Laranja intenso.

A donzela piscou repetidamente buscando compreensão no que a fazia enfiar a agulha no tecido branco. Observou-se por algum instante. Picou o dedo com a agulha e viu uma gota de sangue, a qual, sem pensar duas vezes, levou a boca e sugou. Fora um gesto totalmente inesperado, porém uma angústia cresceu em seu peito, devastando a natureza virgem escondida por ali. Ela chorou por um instante sem lágrimas aparentes.

Largou o bordado, os pensamentos desconexos e permitiu se perder. As lágrimas finalmente desceram em seu rosto, embora já não significassem muita coisa. Ela nem ao menos buscou enxugá-las, por mais que a incomodassem. Ficou paralisada enquanto os fios em laranja ao seu redor iam diminuindo em quantidade. Seu vestido era bonito e bem costurado por suas delicadas mãos macias. Ela, que podia senti-lo belo quando o costurava, nunca o notou belo quando incorporado a sua figura. Esperava subitamente que alguém o amassasse antes do sol se pôr, uma verdadeira pessoa de olhos aptos aos desprazeres da costura detalhista. Queria brincar de roda com as meninas mais novas e sujar de cores o vestido. Girar e girar, e rir depois.

A donzela era velha e pálida.

O sol ria disso e lhe roubava as esperanças. Como se ela soubesse que ainda as tinha.

Os últimos três fios de sol passaram pela vista, zombeteiros. A moça sentiu o sangue pulsar quente nas veias. Seus braços simplesmente não eram mais adornos das vestes, caídos frios, imperceptíveis. Precisavam que agarrasse aqueles fios com toda sua força de mulher. Ela o fez num urro de raiva e eles a levaram na contrapartida da dor.

Correu por toda sua vida. Sendo puxada, viu sua antiga morada, com paredes cor-de-rosa e jardins destruídos pelo inverno e bichos-de-terra que nele brotava. Uma rocha rosada daquelas podia lhe trazer tantas palavras... nada mais que um mero objeto gigantesco que acolhia vida em conjunto. Todas as conversas encenadas ali foram culminações de momentos de aflição. O resto era sempre um passatempo de reclamações repetidas. Custava-lhe admitir que sua infância podia ser resumida como hábito ligeiro. Eram tantas rosas de papel - origami que fazia sozinha - e voavam com os sopros de vento rouco entrando pela janela. Angústia essa de pairar no velho eterno cotidiano.

Logo mais a frente estava o bar onde todos, e aqui recordava todos por alguns tipos mais marcantes de vizinhos, se reuniam escondidos para ouvir o rádio e contemplar sua lataria prateada. Pessoas intranquilas demais, que discutiam fervorosamente havendo qualquer fagulha de oportunidade e suplicavam intimidade forçada. Uma velha dona, por exemplo, fazia bolos para fora enquanto mulher em paz com seu destino. Pedia auxilio sempre negado dos filhos e, pacientemente, tirava as botas do marido com um pedaço gordo de doce na mão para ser servido a seguir. Poucos conseguiam perceber que o que a levava a fazer aquilo castigava-a consumindo qualquer aparição do seu genuíno ser. Ao fim de todo dia, a mulher perdia o contato com a felicidade fingida e esmagava o resto de bolo com as mãos, engolindo migalhas banhadas em vodka, Outra: acontecia pouco, a cada dois meses, mas de vez em quando, ela quebrava pratos e corria pela sala da casa, evidentemente estando segura do sono pesado dos seus satisfeitos. Ela frequentava o bar depois dos surtos, sendo a figura da madrugada. Os fofoqueiros dali só zombavam pelas costas, julgando-a louca. Ela nem sabia, achava que ali era família.

Dentro do bar dançavam outros personagens também inexistentes na luz do dia. Apresentavam-se depois de terem entornado uma dose generosa de pinga e ouvir lamentações próprias em voz alta. Quando não brigavam aos berros com tudo que se movesse na penumbra do alcoolismo, serenavam juntos ao som de uma balada leve. Depois tudo era paixão e aconteciam luxuriosas e engraçadas traições. Ainda bem que tinham aquele lugar. Nesse período adolescente, ainda sem conhecer as virtudes da alta costura, a donzela visitava o local com olhos longes. Aparentemente tudo lhe repugnava, assistindo assim pessoas que se mentiam de dia. Todavia, quando retornava a casa, seu quarto a recebia com risadas irônicas. Ela ria junto até perceber que ria de si. Então chorava e tentava deixar de espiar, curiosa, os frequentadores daquele estabelecimento. Passou a se dedicar a Deus e a costura. Mas ainda olhava de canto de olho.

Existia uma praça bem ao lado do bar. Uma coisa boba toda verde, com flores pequenas que cresciam agarradas a uma forma pré-determinada. O lugar mereceu um suspiro saudoso da donzela, tão incoerente... Tinha gente ali sempre com pouca idade, sem juízo algum que partilhava de desejos curtos e planos confusos. Uma falação desconcertante. Amigas passavam de braços dados e fingiam ser mais velhas para impressionar os rapazes, que por sua vez tocavam seus violões para os companheiros de estudos e fitavam as moças com olhos esnobes, mas com corações palpitantes. Um teatrinho que mal reivindicava platéia.

Somente num único dia aquela praça pareceu ter a existência justificada. A lembrança da donzela era confusa e só contundente em sonhos, mas ela se esforçava para conectar as partes. Havia, no entanto, uma força estranha que destacava o sentimento da memória e reivindicava importância. O certo é o evento ocorrera à noite. Chovia e uma apreensão incômoda crescia no peito como uma trilha de filme de terror. A moça voltava de um recital de ballet em que amigas suas se destacaram como condutoras de jovens aprendizes, uma delas sua irmã mais nova. Uma bela peça despida de verdade. Aquilo foi o ponto crucial para o início da perturbação angustiante. Sem entender a causa de tal bobagem sem sentido, correu dos parentes num rompante de independência apática. Uma garoa leve abriu o cenário. A praça, a luz intensa amarela abraçando os pingos retos, os bancos vazios, molhados – ela se viu em tudo como um guardanapo que se desdobra revelando uma mensagem rascunhada à alguém. O lugar se refez pleno de beleza vazia em si que se apropria da essência alheia a fim de instigar seus despertar. Roubava tudo de todos, cada história, cada sonho, cada encontro, para virar lembrança bonita.

Agora a donzela estava no meio de um grande círculo de descobertas. Sua vista, embaçada com tanta memória. Queria entender porque todos os instantes de grande valia em sua vida foram massacrados pela força do hábito. Sentia-se como uma freira a contra-gosto. Agora que recuperara seus pedaços espalhados pelos cantos do berço, ela podia deixá-lo. Descobrir o que é partir, de repente, se revelou o motivo para ficar. Deixar aquela varanda de tecidos bordados, senão os já tinha concluído, não era mais necessário. Ela não era mais a donzela que se encaixava discretamente nos espaços do tempo vago. Eles começavam a ser seus.

Por fim, o fio último do sol que restava. Toda a reflexão debatida no poente do sol inaugurara visão lúdica. Ali estavam, na sua frente, a senhora e a menina. As duas no chão, curvadas e sujas, com os vestidos levantados e as mangas puxadas. Achavam-se inteiramente entregues ao divertimento e riam a cada jogada errada da outra. Jogavam bolas de gude. Os cabelos, à essa altura, já estavam embaraçados, um cinza, outro preto. O que importava eram as laranjas que rolavam entre elas. Vinham do pomar no horizonte. Nenhuma das duas as notava, somente a mulher que se pôs ali no meio, com seu vestido limpo e sua pele queimando vida. Não tentou pegar as laranjas, elas passaram direto e refizeram o caminho de sua memória resgatada.

A mulher, então, se entregou a paz do constante poente – o que eu lhe deu forças para fazer o que sua mente gritava: do finzinho de sol, ela pegou uma raiva materializada em fio real e caminhou até as duas figuras atrasadas, enforcando-as. Matou na fúria indecente do que se põe. Tudo que podia ser feito foi feito, atentando ao desrespeito às regras da vitória, a mulher de branco se dirigiu à derrota dos vingadores. Desceu a ladeira em direção ao bar. Entrou e pediu uma dose de cachaça. O líquido desceu quente. Virou-se para o dono do bar e pediu que aumentasse o rádio. Ficou ali, somente ali, ouvindo uma balada honesta até que a noite lhe revelasse o caminho a seguir.

quinta-feira, 11 de março de 2010

O Reencontro



Conforme se aproximava da porta de vidro, menos enxergava. A silhueta do homem alto lhe era motivo de amargura, propiciava inclinação à ilusão. As feridas eram reabertas instintivamente, os pensamentos se confundiam entre as linhas do tempo, e a dor que gerava lágrimas era, aos poucos, esmagada pela ira ingênua.

Dentro da sala escura batia um coração ansioso. A situação pedia calma, mas a hipocrisia reinava na cautela. Não existiam motivos suficientes que sustentassem tal posição, embora a fraqueza do homem clamasse pelo conforto encontrado na arrogância. Ele repetia pra si um desejo fraco de perdão e esperava que ele ganhasse força assim que revisse o rosto dela.

Ela agora tremia. As lágrimas não puderam mais ser evitadas. Os passos foram endurecendo e, agressivos, puxaram uma horda de sensações repugnantes. Os olhos faiscaram então. A memória sensitiva fora ativada! – o constrangimento e o medo explodiram num berro contido e o corpo inteiro passou a responder ao calor do ódio. A mulher pôde planejar seu ataque baseado em verbalizar tudo o que fosse mais ofensivo, ditando todo mal que aquele homem cometera e se escondendo na sua carapuça de vítima.

O homem identificou a cor vermelha dos cabelos da mulher, mas se surpreendeu quanto à maneira como se apresentavam. Comparando com o que eram há vinte anos, os fios ruivos perderam a vida e os cachos. Ele se culpou pelo cabelo, enquanto se dirigiu a um espelho qualquer para relembrar suas feições. Não sabia exatamente o que mudara em sua aparência. Seu cabelo também foi notado, assumira tons cinzas; os ombros caíram e os olhos... Eles se tornaram inesperadamente indecifráveis! Eram de outra pessoa, de outro animal ou, ainda, de outra era. O momento se aproximava, ele sabia.

Ela parou em frente à porta de vidro, notando os passos contidos, mas não menos pomposos do homem do outro lado. O imenso corredor chegara ao fim e a porta de vidro fora aberta – as memórias se chocaram de frente!


- Entre. – tal convite não chegou a formular comunicação – Por favor, fique à vontade! 


O segundo convite pouco inspirador do sujeito despencou no chão assim que foi feito. Não chegou a criar raízes, pois foi logo recolhido pelo ego do homem, que com um risinho sonso deu ares sarcásticos às palavras inseguras.

A mulher fez menção de responder, separando os lábios e afiando a língua, todavia o riso saliente a desestruturou. A boca fechou, os olhos abriram. Ela não tinha vantagem alguma naquele jogo contra o passado. Mesmo que ele figurasse claríssimo de cabelos grisalhos, não dava pistas do futuro: o olhar era de um estranho. Não lhe passava pela cabeça olhá-lo por dentro, porém contava com que a intimidade entre os dois revelasse a verdadeira identidade do outro, e que enfim a besta caísse aos pés da donzela.


- Bebe? – ele já voltara de sua inspeção ao balcão com uma garrafa de conhaque.



- Não.


O homem se serviu no próprio gargalo, numa afronta declarada. E ao término de uma longa golada, se restringiu a um simples pigarro refinado. Voltou ao balcão de bebidas e se viu estampado numa das garrafas. À principio não se encontrou no reflexo, mas à medida que cedeu à leveza do seu plano inicial, envergonhou-se do que era. Pedir perdão lhe custava mais que reconhecimentos fáceis.


- Acho que você ainda se lembra, não? – a mulher tomou a sala com seu tom de doce viúva – Lembra-se de quem eu sou, sim?



- Evidentemente. – ele.



- Então, qual é o motivo dessa encenação? – ela.



- Nenhum. – ele – Gostaria de pedir... hum... implorar sua compreensão.



- O “ hum” soou irônico. – ela – Não vejo motivo para tanto.



- Perdão. Não foi minha intenção. – ele.



- Nunca foi, certo? – ela.



- Aí você me pegou! – ele deixou escapar o espectro duma risada franca.



- Eu, sinceramente, não o entendo. O que você quer? – ela... momento vago – Está precisando de alguma coisa? Não... – o homem se virou de costas – Não hesite em pedir se for o caso.



- Não, não é isso! – ele – Isso é mais difícil do que você pensa. Eu não...


O homem fora interrompido pelo susto. Ela se colocou entre ele e suas divagações, o que, de fato, o fez tossir de maneira deselegante. Ele ajeitou o paletó, endireitou a gravata, franziu os lábios, cerrou os olhos, bateu os pés e, enfim, olhou nos olhos da mulher.


- Eu não quero te magoar. – ele.


Ela bufou e saiu de vista, passeando perdida pela sala de visita.


- Ei, é serio. – ele desviou os olhos e, como quem sente dor, prosseguiu: - Eu quero que você me perdoe.


Ele se achou incrivelmente homem por ter se utilizado do recipiente da coragem. A certeza previa a vitória.


- Perdoar o quê? – ela fora tomada pelo cômico da situação – Eu já nem sei mais... – as mãos foram à cintura num instante de reflexão – É isso?



- É – ele.


Ela fugiu da batalha quando ela ia atingindo seu ápice. Tudo era revelado pelos olhos. Cada passo dado pelo adversário era anunciado anteriormente por um olhar desconfiado, e ainda pouco, o homem fizera o imprevisto: baixara os olhos em reverência. As palavras ainda eram pretensiosas e nada sinceras, contudo a bandeira branca estirada a seguir fora inconcebível até nos mais desvairados sonhos da mulher. Ela recusou de bom grado aquela tentativa de reaproximação, evitando pensar demais nas opções ao redor.


- Eu... – ele não sabia o que dizer, nem o que querer.


Ela pegou sua bolsa na poltrona e quase correu para a porta, com as lágrimas forçando para sair.


- Eu te amo, você sabe. – ele, rouco.


Ela parou e os olhos vazaram.


- Eu preciso de você. – ele, nervoso; temeroso das palavras que atropelavam seus pensamentos lógicos.


Continuou:


- Precisei de vinte anos e alguns minutos para descobrir isso – suas mãos suavam deselegantemente. – Você, só você me conhece.



- Isso torna as coisas mais fáceis, não? – ela se virou com os olhos inchados e a maquiagem excessivamente borrada – Agora, o que eu posso dizer de você? Primeiro: eu não preciso de você, assim como não precisei todos esses anos. – a voz dela se manteve numa tétrica estabilidade – Você é arrogante! – ela balançou a cabeça em descrédito, embora as palavras secas fossem indevidamente reais – Você não gosta de ninguém a não ser de si mesmo.


Pausa!


- Sim, eu já te amei! Mas já foi, eu não ligo mais! – os braços da mulher foram esticados paralelamente ao teto – Estou exausta! E isso não vai dar em nada. – ela sussurrou: – Por favor, me deixe ir.


Soluços de ambas as partes.


- Eu não estou te impedindo. – o sorriso dele foi genuinamente charmoso. – O nosso amor está! – ele estendeu a mão em direção a ela – Fica.


Ela desabou. Os dois estavam no mesmo patamar. Não mantinham as máscaras. As lembranças desgostosas que os uniam foram destrinchadas por completo e, sem palavras, se entenderam e reconheceram. Caíram juntos, escaparam das ilusões, assassinaram o passado numa terrível parceria fatal e passional.

No fundo, ironicamente e por vinte sombrios segundos a sós em suas respectivas mentes, criaram um desejo qualquer de vingança. De repente, seria deleitosa a sensação de ter o coração do outro na mão e poder senti-lo bater bem devagar, contrariando as noções básicas. Ter poder sobre o sentimento alheio, sugar cada gota ínfima de sangue e celebrar a dor. Mas esses vinte segundos foram há vinte anos... E o desejo foi se perdendo... Hoje eles tentam reavivá-lo, estúpidos! Desgastes em vão.


- Por que? – ela – Você me magoou muito... Ainda dói muito... – ela pressionou a mão no peito – Você espera que eu simplesmente esqueça?



- Isso seria pedir muito? – ele.


Ela afirmou com a cabeça porque as palavras não tinham oxigênio suficiente para existir.


- Então, não há mais nada a dizer... – ele, livre.



- Não. – ela, livre.


Os dois não se olharam. De cabeças baixas, um de frente para o outro, permaneceram. Talvez, depois de alguns minutos, eles se abracem ou até se beijem. Podem continuar a conversa, e se confundirem quanto às sensações. Ela pode ir embora em paz, sem dizer nada. Ele pode correr atrás dela depois de refletir sobre o futuro, pode parar o trânsito das coisas e gritar seu amor em público, mais alto que si. Mas o que é certo, antes de qualquer outra coisa, é que eles se olhem. Daí em diante irá valer o que foi dito em silêncio, por duas crianças constrangidas pelo tempo. 

Mesária


Quando eu estiver sobre a mesa
e meus olhos te apontarem aquele brilho,
as lágrimas escorrerão ao contrário.
Cairão no chão...
E você estará lá.

Na janela meu olhar
fitará nossos sonhos:
os iluminados do sol,
reluzentes estelares.
Não haverá mais amor.
Em seu lugar somente o calor
dos nossos sexos úmidos,
em vão.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Poesia presidencial


Votem no poeta!
Poeta para presidente!
Por que não os poetas?
Os poetas para presidente?
Os poetas idealizam
e governam em sonhos.
Porque não os poetas para presidente?

Os poetas fogem da verdade
e não corrompem a realidade.
Os poetas brindam a vida
e felicitam-na vivida,
por que não os poetas?
Esses para presidente?
Eles linguam diferente,
não falam que nem gente.
Somem de vista
e nos deixam à parte.
Os poetas são invisíveis
São breves visitas, brisas.

Esses que se dizem poetas;
os poetas mentem.
E, eles que se mentem,
invadem nossa mente,
mudam o que se sente
fingem nossa gente.

Os poetas são homens.
Desses homens presidentes.