segunda-feira, 29 de maio de 2017

Sonho tardio


Ontem sonhei com uma sala
Uma reunião inacabada
De rostos conhecidos
E desconhecidos
Tirando um cochilo,
Arranjados em desalinho.

Três mulheres dormiam no tapete
De linhas amarradas em nós rentes.
A primeira, mais velha,
Tinha cabelos brancos com uma mecha
Preta bem penteada para trás.
Olhava as outras duas, suas filhas,
Deitadas debruço, caras escondidas
Debaixo das mãos
Pressionando choro contra o chão.

No sofá, perto das mulheres,
Outros corpos sonhavam leves
Sobre quem partiu ontem
E quem foi antes.
Pareciam meio acordados,
Apesar dos olhos semicerrados
E sorriam
Sorrisos de netos e bisnetos
Marcando tempos inquietos
Espaçados entre as mobilhas
Da sala quase toda adormecida.

Mais despertos
Estavam os insetos,
Que pousavam vez ou outra
Num dedão ou numa boca,
Traçando caminhos confusos
Na captura de todos os minúsculos
Quase imperceptíveis
Traços e relevos nas superfícies
Daqueles corpos aparentemente
Desatentos às atualizações do presente.

Então uma cena se repetia
E repete no agora, à luz do dia:
A mulher do chão vira de costas
Finge que nem vê a hora
Outra, no sofá, abana mosquito
Que quase invade seu ronco aflito.
Todos se mexem
E a tarde padece
Na noite.

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